O Au Passage nasceu com o Boom de neo-bistrots e Wine bars que foram invadido Paris a partir de 2010. Cedo ganhou destaque e em 2012 era já um dos preferidos da agitada nova cozinha parisiense, sendo inclusive um dos premiados como “Fooding d’Amour 2012”!
Quis o destino que um espaço que tanto reflecte uma nova forma de olhar a cidade, longe do luxo e dos palácios, mas sempre focado em mostrar os melhores produtos franceses, tenha vivido sobretudo de chefs estrangeiros ao leme da cozinha. De James Henry a Dave Harrison passando por Shaun Kelly ou Edward Delling-Williams (que já passou pelo Euskalduna para um jantar a 4 mãos com Vasco Coelho Santos), e que agora a “sorte” tenha calhado a Luís Andrade, um português, feito designer e transformado em cozinheiro pela vida parisiense.
Há anos que o restaurante andava na nossa lista de espaços a visitar, e desta vez tínhamos a desculpa perfeita!
O espaço reflete a agitação da nova e viva Paris, bem diferente da histórica Belle Époque, é certo! A decoração, saída de uma qualquer feira da ladra, transporta-nos para um ambiente de tal informalidade, que não é fácil distinguir entre clientes e funcionários, tal é a agitação que se vive durante o jantar.
Aqui é mais provável jantarmos ao som de Tupac ou B.I.G. que de uma calma música ambiente, acabando a abanar a cabeça enquanto vamos partilhando os vários pratos que compõem a carta e damos mais um mergulho na boa seleção de vinhos naturais.
Salsicha seca
A forma mais habitual de começar um jantar por aqui. Produto de excelente qualidade, bem acompanhado por pickles e um excelente pão, que viria a revelar-se essencial durante todo o jantar.
Ostras e maracujá
Ostras de bom tamanho, regadas com uma espécie de ponzu de maracujá. Primeiro estranha-se depois acabamos rendidos e a achar a combinação de Luís Andrade bem conseguida.
Vieira e Kumquat
Aqui percebemos rapidamente que apesar de toda a descontração do espaço, dos preços e do ambiente, a cozinha segue numa direção quase oposta – há aqui muito trabalho, muitas ideias e muito rigor na escolha de produtos. Vieiras em tártaro, temperadas na perfeição, com elementos crocantes a dar o toque necessário e uma emulsão de kumquat, que nos prepara para perceber que o segredo deste chef são os molhos.
Abalone, aipo e cogumelos
O toque mais japonês do menu, chega com um delicioso caldo, bem rico pelo sabor dos cogumelos, ladeados pelo toque de frescura do aipo e a textura única do abalone. Muito bom!
Lavagante
Tagliatelle feito no restaurante, com um molho fantástico e repleto de sabor, com o lavagante cozinhado num ponto tão certo, que nem sempre o encontramos assim em restaurantes estrelados. Um dos melhores pratos de pasta com marisco que já provamos!
O padrão estava elevadíssimo! Na realidade estávamos como duas crianças a pensar no que mais poderia sair dali quando:
Moleja, Espinafres e tâmaras
Um grande, grande prato! Molejas bem trabalhadas com um delicioso molho de carne, feito com manteiga de alcaparras. Espinafres suaves com o toque de sabor e textura da amêndoa, e uma incrível pasta de tâmara. A esta altura já não havia pão que resistisse aos molhos.
Pombo, shiitake, café e Polenta
Mais um prato de grande de rigor técnico, onde menos é claramente mais! Tudo cozinhado nos tempos certeiros, com o pombo a fazer-se acompanhar mais uma vez por um molho de elevadíssimo nível e uma bem conseguida polenta de café.
Tarte de Belém e Chocolate
Duas sobremesas bem distintas, uma a fazer uma espécie de regresso a casa para o chef que pegou na receita do clássico Gâteau breton e o recheou com um creme semelhante ao nosso famoso pastel português.
O chocolate, como o próprio nome indica, era isso mesmo, diferentes técnicas e texturas de chocolate, apresentadas num só prato, onde o destaque vai claramente para a bem conseguida mousse.
Ambas as sobremesas se revelaram um final mais que feliz!
Sobre o serviço, é importante lembrar o comentário feito anteriormente, sobre ser difícil distinguir entre staff e clientes, o que neste caso provou a diligência e a camuflagem de que são munidos estes colaboradores.
Considerações Finais
Para quem vive a restauração como eu, não há muitas coisas melhores do que sair surpreendido de um restaurante, fazer wow a cada prato, enquanto reviramos os olhos e lambemos os lábios. Quando um espaço como o Au Passage, com menus em ardósias, copos sem interesse e uma decoração em jeito de aproveitamentos, nos surpreende desta maneira, é a felicidade total! Ao olhar para a carta e os seus preços estamos longe de perceber o trabalho por trás de cada prato, seria bem mais fácil descongelar e usar o micro-ondas, mas não, “não teria a mesma graça!” deverá pensar Luís Andrade e a sua equipa, que começam pela manhã a preparar os jantares (o restaurante apenas está aberto das 19h à 1h30).
É uma lufada de ar fresco encontrar pessoas dispostas a trabalhar ao ritmo da estação, com menus que mudam diariamente e que não têm pretensões de sobrecarregar os clientes com preços altos, porque qualidade, padrão e rigor em nada lhes falta!
Um restaurante a ir, voltar e repetir sem desculpas.
Preços a partir de 35€ (sem vinhos)
1 bis, Passage Saint-Sébastien – Paris
+33 (0) 1 43 55 07 52
baraupassage@gmail.com
O Chef Luís Andrade deixou o Au Passage no final de 2019.