Il Ristorante no Bvlgari Hotel Roma: Essência Italiana e o coração de Niko Romito

Niko Romito, um dos mais influentes chefs italianos, redefiniu a alta cozinha ao reduzir cada prato à sua essência mais pura. À frente do Reale, três estrelas Michelin, ele elevou o minimalismo e a autenticidade ao estatuto de arte culinária. A sua parceria com o grupo Bvlgari marcou um passo inédito: a internacionalização de uma visão autoral para os destinos mais exclusivos do mundo, provando que técnica e identidade podem viajar sem perder a sua genuinidade. São vários os hotéis com a assinatura do chef através do “Il Ristorante – Niko Romito”, com estrelas Michelin em localizações tão distintas como Dubai ou Tóquio. No mais recente espaço, localizado no imponente Bvlgari Hotel Roma, ele reafirma a sua procura por sabores genuínos, e a reconstrução do receituário tradicional utilizando o terroir como guia.

O restaurante é uma síntese perfeita entre a sofisticação contida de Niko Romito e o requinte intemporal da assinatura Bvlgari. Moderno e profundamente italiano, o espaço é banhado por uma luz cálida que atravessa amplas janelas, destacando materiais nobres, onde a pele, a pedra e a madeira sussurram histórias da Roma Antiga.  Elementos subtis evocam a tradição romana, criando um equilíbrio entre requinte e conforto. O ambiente combina intimidade e bem-estar onde a comida brilha sem exageros.

A Vivência: Uma Viagem Entre o Simples e o Sublime

Antes de nos sentarmos à mesa, passamos pelo Bvlgari Bar para um aperitivo, bem ao estilo romano. O destaque foi o Marygold Negroni, um cocktail que combina Vermouth Mancino Amaranto Rosso, Campari, Tanqueray Ten, flores de Marygold e Yellow Chartreuse. Complexo e aromático, destacou-se como um dos twists mais memoráveis do clássico Negroni que experimentei em 2024. Acompanhado por aperitivos delicados como tártaro de peixe ou focaccia com mortadella, a ocasião trouxe aquela sensação de fim de tarde tipicamente italiana, onde tudo parece desacelerar para apreciar a dolce vita.

taça com o caldo absoluto de Niko Romito
O Absoluto de Cebola, Cenoura e Aipo

Se o bar nos prometeu um prelúdio descontraído, à mesa a música muda: aqui, a precisão culinária orquestra o espetáculo sem jamais esquecer que o público quer aconchego e não uma aula de cozinha molecular. Começamos com Champagne Maurice Vesselle La Cuvée 53 Grand Cru, que trouxe frescura e elegância e um amuse-bouche que define a filosofia de Romito: o Absoluto, um caldo que captura a essência do sabor na sua forma mais pura, um caldo sem adição de água, preparado apenas com a extração da água de cada vegetal que o compõe. Este primeiro contato é quase uma declaração de intenções, um prelúdio de que a simplicidade pode ser profundamente complexa.

Na sequência, fomos apresentados a uma seleção de pães que é, por si só, um dos pontos fortes e uma das paixões do chef, dos crocantes de massa mãe aos viciantes grissini, passando pelo pão de fermentação lenta, a simplicidade que facilmente se torna uma aula de técnica e terroir: texturas, aromas e sabores que transformam algo quotidiano.

prato com escarola e ervas que revela a filosofia de Niko Romito
Escarola Glaceada, Creme e Pinhões e Tomate Cereja

Entre as entradas, a escarola glaceada entrou como coadjuvante e, no final, roubou o Oscar do prato principal. É a prova viva de que até as folhas podem ter o seu momento de glória, desde que tenham o chef certo. O amargor subtil da escarola encontrou harmonia na cremosidade do pinhão e a acidez dos tomates cereja, entregando um prato que fala diretamente ao coração da filosofia de Romito. Mais do que um prato, foi uma narrativa vegetal que encapsulou a essência de Romito: simplicidade elevada a arte. A cada garfada, era impossível não antecipar a magia que nos aguarda no Reale.

Prato moderno de Vitello Tonnato feito por Niko Romito
Vitello Tonnato

Ainda entre as entradas, o Vitello Tonnato trouxe uma interpretação contemporânea de um clássico, onde o equilíbrio entre textura e sabor revela o respeito de Romito pelas tradições, não as mudando radicalmente mas acrescentando-lhe pequenas nuances que complementam o prato. Muito bom!

Para harmonizar com as entradas, o sommelier propôs, e bem, um Fattoria Coroncino Stracaccio, um produtor histórico para os vinhos naturais da Itália, que nunca precisou de rótulos ou tendências para colocar os seus bem executados vinhos no mercado.

prato de pasta com lavagante e camarão vermelho de Niko Romito
Linguine com Lavagante e Camarão Vermelho

O linguine com lavagante e camarão vermelho, foi uma ode ao Mediterrâneo: marisco delicado, molho impecável numa conversa de sabores tão bem ensaiada que parece um discurso político em perfeita harmonia – uma raridade, diga-se. 

Pasta com molho de tomate, um clássico moderno de niko romito
A famosa pasta com tomate de Niko Romito

Ainda nos “Primi” tivemos o prazer de degustar outro prato emblemático: o Spaghetti al Pomodoro, uma criação assinada por Niko Romito. Este prato, que se tornou uma assinatura nos “Il Ristorante”  destaca-se pela sua simplicidade e profundidade de sabor. A receita, desenvolvida no Reale há cerca de uma década, reflete a paixão de Romito pelos tomates, ingrediente que ele considera essencial na culinária italiana.A preparação do Spaghetti al Pomodoro envolve técnicas precisas para extrair o máximo sabor dos tomates, resultando num molho equilibrado que envolve perfeitamente a massa. Este prato é uma ode à tradição italiana, onde a qualidade dos ingredientes e a execução meticulosa se unem para criar uma degustação memorável.

Curiosamente, em ambos os casos, a pasta é cozida ligeiramente além do ponto al dente tradicional, uma escolha intencional do chef para evitar o toque farináceo que por vezes persiste em massas demasiado firmes. Um prato que facilmente se tornaria uma escolha diária.

Belíssimo prato pintado à mão a servir de base para pregado com trufa branca e um aveludado molho de alho francês
Pregado com Trufa Branca e molho de Alho Francês

Nos pratos principais, o Pregado com trufa branca e molho de alho francês foi um prato que pairou entre o técnico e o emocional. A suavidade do pregado, perfeitamente cozinhado, contrastava com o aroma inebriante da trufa branca, que estava no auge da sua maturidade. Embora um toque de sal pudesse aprimorar o prato, o molho de alho francês trouxe uma profundidade inesperada, elevando a experiência e deixando uma impressão marcante.

Aqui, o sommelier Fabrizio Gismondi arriscou o pairing com um desconcertante Pitasso 2020, um 100% Timorasso de Claudio Mariotto. Um vinho de aroma bem próprio, em que o que poderá parecer defeito à primeira vista se torna identidade à medida que vai evoluindo no copo e demonstrando na boca o seu corpo rico e uma mineralidade bem vincada.

Prato com uma costeleta de vitela panada ao estilo milanês
Costeleta Milanesa

Para terminar o capítulo salgado, partilhamos uma Costeleta Milanesa. A vitela de leite, servida crocante e suculenta, foi acompanhada por cogumelos salteados, batatas assadas e espinafres com alho, azeite e malagueta, trazendo mais uma vez acolhimento e requinte em igual medida.

Para a carne, o Morey Saint Denis 2008 de Pierre Bourée Fils foi uma escolha certeira, adicionando profundidade, estrutura e aroma ao conjunto.

Cremoso de Pera, Praliné de Avelã e Pera
Bonet – Uma espécie de pudim de chocolate e amaretti

As sobremesas foram uma celebração de técnica, apurado sentido estético e equilíbrio, evitando qualquer excesso de doçura. O Cremoso de chocolate com praliné de avelã e Pera foi um estudo de contraste entre textura e sabor, enquanto o Bonet, resgatou a tradição piemontesa renovando-a com o gelado de caramelo que adicionava um toque luxuoso e nostálgico.

Mil Folhas de Chocolate Branco e Caramelo Salgado

Por fim, o Mil folhas, coroou a vivência com camadas de massa fina e crocante em contraste com o creme rico e aveludado de chocolate branco que derretia na boca, complementado por um caramelo salgado, simultaneamente animador e sofisticado. Um belíssimo final, para um capítulo que tantas vezes é menosprezado.

petit fours

O serviço decorreu de forma profissional sem salamaleques ou aparatos, mas com sorrisos, partilhas e humildade, que tantas vezes falta em restaurantes localizados em hotéis de luxo. Palmas também para o Sommelier Fabrizio Gismondi, que curiosamente iniciou o seu percurso no vinho em Portugal, e que soube aqui criar uma carta e um fio condutor no menu que fugiu das escolhas convencionais, mostrando produtores irreverentes e surpreendendo com algumas escolhas inesperadas – é isso mesmo que se espera de um sommelier, e que tantas vezes falha.

Conclusão

A vivência no Il Ristorante é ‘um verdadeiro jantar’ no sentido mais amplo e positivo da expressão. Muitas vezes, quando visitamos restaurantes de chefs, mais ainda com os predicados de Niko Romito, esperamos uma aula sobre gastronomia, esperamos ser chocados com combinações ou confrontados com novas técnicas e sabores, mas não, felizmente não foi isso que Niko quis para este espaço. Aqui desfrutamos de gastronomia italiana executada com a precisão de uma cozinha de autor mas com os ingredientes e os sabores da cozinha das avós, ainda que aqui e ali o ADN de Romito se faça sentir de forma mais evidente. É um restaurante para relaxar e desfrutar, um escape do bulício da cidade em que Niko Romito prova que luxo e requinte não está no excesso, mas sim na capacidade de evidenciar a essência de certos elementos.

Entre o bar e a mesa, pratos e vinhos, histórias e sabores, cada instante parecia calculado para nos lembrar por que a cozinha italiana é um abraço caloroso disfarçado de refeição. Saímos com a certeza de que, às vezes, o maior luxo é encontrar um refúgio e autenticidade na simplicidade de uma refeição.

Para “desconfortos”, aulas e encontros que abalam completamente os alicerces da nossa visão culinária, o destino certo é o Reale! Mas, lá iremos! Aqui, o lema foi outro: relaxar, desfrutar e deixar o ‘drama’ para o cinema italiano!

Preços a partir de 100€ (sem vinhos)
Bvlgari Hotel Roma – Piazza Augusto Imperatore, 10, Roma

Fotos: Flavors & Senses e *D.R.
Textos: João Oliveira
Versão Inglês
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