Londres é cada vez mais uma meca gastronómica, sendo não só um destino apetecível para todos os gastrónomos como também para os chefs que por lá se vão estabelecendo ou abrindo espaços – veja-se o caso de Heston Blumenthal, Daniel Boulud, a família Arzak, David Muñoz, Anne-Sophie Pic, Virgilio Martínez, Alain Ducasse ou Pierre Gagnaire, só para citar alguns.
A verdade é que chega a tornar-se difícil acompanhar toda essa azafáma na cena gastronómica Londrina, onde uma das mais recentes aberturas serviu de pretexto para uma rápida visita à cidade e a um hotel onde já tinhamos sido muito felizes, o One Aldwych, bem no coração de Covent Garden (ver).
Depois de cerca de dois anos de negociações e obras, o contemporanêo Boutique Hotel recebe o Eneko at One Aldwych, que como o nome indica, traz a Londres a cozinha do Basco Eneko Atxa (*** Michelin no seu Azurmendi e uma presença constante no guia The World’s 50 Best). Uma “contratação” de luxo que durante muito tempo colocou os holofotes de olho na abertura deste espaço.
A sala de jantar do Eneko at One Aldwych*
Para esta abertura nada foi deixado ao acaso, desde a arrojada decoração entregue à famosa Casson Mann, que presta homenagem à origem industrial do edíficio do One Aldwych (que fora durante o século passado sede do jornal Morning Post), onde não falta um toque de País Basco com os sofás em tom de pimenta de Espelette, mobiliário desenhado especificamente para o espaço e uma combinação arrojada de texturas que torna o amplo espaço moderno mas simultaneamente acolhedor.
Todo este trabalho tem o seu auge mal passamos pela porta e começamos a descer a escadaria (digna de Reis e celebridades que gostam de vincar a sua entrada) e passamos primeiro pelo bar, onde à boa maneira basca é possivel degustar alguns Pintxos com Txakoli ou cocktails de assinatura, criados especialmente por Pedro Paulo para o restaurante.
Já instalados numa ampla e confortável mesa, demos início à nossa experiência.
E começamos muito bem, com uma ótima selecção de pães – com destaque para o sourdough – e uma deliciosa manteiga com manjerição e cebolinho que é combinada na mesa com bonito almofariz – um início simples e bem eficaz, que combinou na perfeição com o cocktail French 75 , uma criação que juntava Gin Mare, ervas frescas, limão e Cava.
Memórias da Baía de Biscaia
A cozinha deste Eneko, não é uma adaptação londrina do Azurmendi, é um espaço com a sua própria identidade, bem mais simples e informal onde o chef basco quis prestar homenagem às suas raízes. Um bom exemplo disso é esta primeira entrada “Memórias da Baía de Biscaia”, onde procura trazer a intensidade e os sabores do mar, tão populares por aquelas bandas. Para isso recorre a algas e gelo seco (sim ainda faz furor em 2017) para servirem de base a um ótimo caranguejo (provavelmente uma navalheira a julgar pelo tamanho) com molho armoricaine com toda a carne a ser servida dentro da carapaça, cheio de sabor a mar e uma elegante doçura. A ostra soberba, com uma boa emulsão de plankton e um excelente tártaro de camarão com ovas de arenque servido dentro de um ouriço de porcelana. Um belo início!
Parfait de Foie, compota de maçã com Txakoli
Outra interessante apresentação, com parfait a ser servido dentro de uma bonita maçã de porcelana. Nota alta para a frescura e combinação de sabores da maçã verde envolvida em vinho Txakoli e a textura e gordura do parfait. Boa nota também para a massa crocante que traz mais uma textura ao conjunto. Trocaria era facilmente as tostas de uma éspecie de sablée salgado pelo pão de sourdough!
Pescada, Pimentos vermelhos e emulsão de salsa
A amada pescada dos bascos, conheceu aqui uma “adaptação à Inglesa” em jeito de Fish & Chips. Mas o prato é muito mais do que isso, é uma tempura irrepreensível – seca e bem crocante, e uma pescada mais do que perfeita – húmida e cheia de sabor. Bom apontamento dado pelo confit de pimentos que nos traz alguma carga e sabores da terra, mas aqui o destaque vai todo para a pescada, provavelmente o melhor pedaço de peixe frito que alguma vez comi!
Rabo de Boi, emulsão de cogumelos
Apesar de ser um dos meus “cortes” fetiche, foi o prato que menos me surpreendeu. Apesar de visualmente irrepreensível e da fantástica emulsão de cogumelos, o desfiado de carne passou um pouco do ponto de suculência ideal e o conjunto tornou-se demasiado doce. Faltou um elemento ácido ou um acompanhamento que equilibrasse a balança.
Arroz de cogumelos
Um arroz bomba, bem caldoso, cozinhado no ponto, e rico no sabor a cogumelos que é ainda elevado pela emulsão de cogumelos que lhe serve de topping. Um grande, grande arroz!
Marshmallow de Rosa, Sorvete de morango
Uma sobremesa bem ao meu estilo, leve e fresca sem muitos elementos e com algumas texturas. Fantástico o gelado de morango de textura aveludada ao bom jeito da pacojet, bem conjugado com os morangos frescos (estranhamente bons dada a altura do ano) e a espuma de morango juntamente com a leveza do marshmallow e as láminas de rosa. Muito boa a combinação dos sabores e aromas florais e frutados!
Mousse de caramelo salgado, crumble de bolacha e gelado de leite de ovelha
Uma sobremesa bem mais pecaminosa ainda que com a doçura bem equilibrada. Excelente a mousse, fantástico o gelado, numa boa conjugação de elementos e texturas. Belo final!
A carta de vinhos, não sendo enorme, apresenta uma excelente seleção de vinhos espanhóis com muitas opções a copo. No nosso caso, optou-se por um vinho da Rioja, 100% Tempranillo (que é como quem diz a nossa Tinta Roriz) R & G de 2011, com notas de madeira, baunilha, fruta vermelha madura e várias especiarias. Na boca este vinho de Rolland Galarreta revelou algumas notas da tosta, um corpo médio, muita fruta e uns taninos bem marcados, um vinho moderno que segue as tendências mais atuais, mas que não me satisfaz pessoalmente. A hamonização foi particularmente feliz com o rabo de boi, o arroz de cogumelos e o confit de pimentos.
O Serviço de sala esteve mais do que à altura da refeição, demonstrando celeridade, simpatia, boas sugestões e um excelente conhecimento da carta apresentada.
Considerações Finais
Antes de pensar em marcar uma mesa neste Eneko at One Aldwych é importante evitar um erro em que muitas vezes se cai quando um nome como o de Eneko Atxa abre um novo restaurante, o excesso de espectativas. Isto porque a ideia não foi, nem é, criar um “novo” Azurmendi, mas sim abrir um novo conceito, bem mais informal, sem complexidade e claro, sem a estrutura e preços de um 3 estrelas . O selo do chef está bem patente, não só nas apresentações e técnicas como nas combinações de sabores e na inspiração basca que é aqui a sua principal base.
Posto isto, este Eneko é uma das novas grandes opções na zona de Covent Garden, a carta aparentemente simples tem detalhes de risco e inovação e algumas coisas que vivem na perfeição, como foi o caso da Pescada que tão cedo não esquecerei!
Visita obrigatória!
Eneko at One Aldwych
Preço médio: £40 por pessoa sem vinho nem taxas
1 Aldwych – Londres
+44 20 7300 0300
eneko@onealdwych.com
Fotos: Flavors & Senses / * foto de divulgação
Nota
Estivemos no Eneko a convite do One Aldwych Hotel, sendo que isso em nada altera o nosso trabalho cuja opinião e o texto são da exclusiva responsabilidade do seu autor.