Shiko – Tasca Japonesa

Volvido cerca de um ano e meio desde sua abertura, o Shiko já fez volver muitas páginas, entre blogs, revistas online e jornais, trazendo a expressão “Izakaya” ,que é como quem diz Tasca, até ao vocabulário dos sushilovers portuenses.

Ruy Leão, o seu mentor, era um nome já conhecido na cidade, depois de deixar o Brasil, passar por Guimarães e se juntar ao chef Pedro Nunes para colocar o restaurante Quarentae4 na rota dos principais espaços de sushi da cidade. Anos volvidos, muitos peixes arranjados e experiências feitas (projecto de street food  – Shika) o Ruy e a sua mulher Alexandra decidiram abrir uma casa em nome próprio, onde dariam atenção às ideias com que o chef ia sonhando.

E assim nasce o Shiko – Tasca Japonesa, numa zona pouco valorizada e onde dificilmente se esperaria encontrar um bom espaço de cozinha japonesa, mais propriamente na pouco afamada  Rua do Sol junto da Universidade Lusófona, ali a meio termo entre o Teatro de S.João e o funicular dos Guindais.

Visito o espaço desde a sua abertura e é fácil de perceber que o sucesso que o restaurante teve esteja subjacente ao seu ADN, com uma carta focada em petiscos de cozinha japonesa a que os portuenses não estavam habituados, um ambiente acolhedor, confortável e informal e, claro, o obrigatório Sushi.

Sucesso que lhe valeu a nomeação e a consequente vitória em duas das categorias mais interessantes dos prémios “Flavors & Senses – Os melhores para 2016” com Ruy Leão a vencer a categoria de Chef a Seguir e o Shiko a levar o prémio na concorrida categoria de Restaurante Revelação (ver).

Depois de muitas visitas, umas melhores que outras, mas sempre com um nível elevado, optamos mais uma vez pela marcação na Mesa do Chef, em que os comensais ficam entregues à selecção e inspiração dos pratos do chef para aquela ocasião (40€ pp, sem bebidas)! E foi aqui que, completamente às escuras Ruy Leão nos surpreendeu com um outro nível!

Couvert, petinga de escabeche, búzios com kimchi e salada de espinafres com Sésamo 

E aqui começa esse outro nível que referi, se já gostava da tempura de tomate cherry, do edamame ou das algas, o escabeche de petinga fez corar muitas das nossas receitas mais tradicionais tal era o apuro do seu tempero. Já o búzio com excelente textura foi bem complementado pelo lado picante do kimchi mas sem perder o seu lado de mar, assim como os espinafres bem preparados com as notas tostadas do sésamo. Grande início!

 Mexilhões com Caril Japonês

No Japão o caril é normalmente mais suave e doce que o Indiano, e este de Ruy Leão prova isso mesmo. Marisco no ponto e molho bem afinado e equilibrado, permitindo que o mexilhão seja o rei do prato. Nota positiva também para a frescura dada pelo cebolo ao conjunto.

Tártaro de Wagyu, folha de arroz e ovo de codorniz 

Apesar do tempero irrepreensível e da técnica rigorosa (excelente a folha de arroz crocante), foi o prato menos interessante da noite, muito por culpa da textura de carne, que sendo wagyu se pretenderia mais tenra e untuosa.

Ceviche de Vieiras

Já todos sabem que este verão Ruy Leão se juntou a Camilo Jaña para juntos abrirem a primeira cevicheria da cidade, o Panca, pelo que uma versão nikkei do famoso prato peruano é obrigatória numa degustação do chef. Aqui numa versão de vieiras, com algas, sumo de lima, ikura e o seu coral. Com as vieiras bem delicadas e o caldo de apurado sabor que se bebeu até às últimas gotas. Muito bom!

Gyoza de Mexilhão, pak choi e molho ponzu

Sou um confesso adepto de gyozas, com a sua camada crocante por baixo e macia por cima, mas aqui o chef optou apenas por cozer a gyoza recheada com mexilhão e envolver tudo em molho ponzu. Prato elegante e de sabores subtis, onde a acidez controlada do molho se equilibra com a doçura do mexilhão, e a textura leve da gyoza encontra um crocante na couve. Um grande prato!

Caranguejo Real, batata nova com vinagre e sardinha seca

Mais um daqueles pratos de que não estava nada à espera, primeiro pelo ingrediente principal, caranguejo real e segundo pelo acompanhamento das batatas cozidas, temperadas com vinagre e pó de sardinha. O Caranguejo envolvido num espesso molho com dashi e gengibre. Um prato pecaminoso que é difícil parar de comer, com o caranguejo e o seu molho a deixar toda a mesa arrebatada.

Lingueirão ao vapor com sake 

Se os nossos restaurantes tradicionais têm amêijoas à bolhão pato, o Ruy traz até à mesa um Lingueirão cozido ao vapor com um molho de citrinos e sake com uma salada de algas. Marisco irrepreensível, algas saborosas e molho fresco que tornaram o conjunto não só diferente como fizeram dele um grande petisco.

Beringela com molho de amendoim e sésamo

Já havia provado uma outra versão deste prato, que na altura não me deixou propriamente encantado por achar o conjunto doce demais, mas aqui o molho revelou-se bem menos enjoativo e mais equilibrado, envolvendo-se bem com a beringela assada, cuja textura quase cremosa se dissolve na boca.

Cavala Marinada

Agora entramos no campo dos clássicos, com um dos pratos que por mais que o Ruy queira é impossível retirar da carta, a cavala marinada com miso e alho. Peixe firme, ligeiramente braseado e molho equilibrado, com o alho a marcar a presença sem excessos. É fácil perceber porque conquistou os palatos portugueses, habituados a sabores fortes e potentes.

Tataki De Salmão

É difícil vir ao Shiko e não encontrar pelo menos um destes tatakis pousado em cada mesa do restaurante, sendo provavelmente o seu best-seller, não só pelos finas e bem preparadas fatias de salmão, como especialmente pelo espesso molho de miso e o shichimi togarashi (tempero japonês à base de 7 ingredientes), que lhe eleva o sabor. É sem dúvida um excelente prato.

Futomaki, Uramaki “carapau valente” e Uramaki ebi nambam

Apesar das barrigas já irem bem cheias não podíamos parar sem provar uma ou duas peças de sushi. Ficando de lado os meus habituais niguiris, a escolha do chef recaiu sobre o seu leve e crocante futomaki – rolo grosso com vegetais marinados e peixe, o “carapau valente”, num uramaki com carapau, gengibre e beringela marinada em miso e um clássico uramaki com camarão panado em panko. Nota altíssima para o shari (arroz), bem cozido e com a acidez certa, e para os sabores dos vários conjuntos, em que o carapau se distingue pela potência, e o futomaki pela subtileza e crocância.

Pavlova Exótica

Para partilhar, no final de toda a refeição, uma sempre irrepreensível Pavlova, o único elemento do jantar que Ruy não assina, estando a criação a cargo da já famosa MissPavlova. Doce quanto baste, com um bom jogo de texturas e um curd de maracujá que eleva e refresca o conjunto.

Na mesa do Chef o serviço é um pouco distinto e mais privado, sendo feito quer pela equipa, quer, como seria expectável, pelo próprio chef que se junta aos comensais para explicar as suas criações. Sempre simpático, eficiente e descomplicado como pede uma boa tasca.

Quanto aos vinhos, tenho sentido uma constante evolução na carta, com algumas opções fora da caixa como o II Terroir da Quinta da Casa Amarela, um vinho que junta alvarinho da Quinta do Regueiro (Melgaço) com as uvas brancas do Douro ( Casa Amarela), resultando num vinho raro, com algum domínio aromático do alvarinho e uma estrutura própria do Douro, mantendo uma frescura delicada que acompanhou bem com os petiscos do menu.

Acompanhou-se a refeição ainda com um Alvarinho Contacto 2015 de Anselmo Mendes e um Riesling da Alsácia de 2014 da família Hugel. Dois belos vinho trazidos para o jantar por um dos comensais, que harmonizam perfeitamente não só com o sushi como com os diversos petiscos de sabores japoneses.

Considerações Finais
O Shiko é um daqueles restaurantes que recomendo aos amigos sempre que me solicitam, seja porque querem um bom sushi ou porque querem provar um prato com ingredientes e temperos  fora daquilo que normalmente se encontra por cá. Mas agora Ruy Leão está mais seguro, já tem o seu público e os seus fervorosos adeptos, pelo que se nota estar a preparar um salto qualitativo.

Depois deste jantar não me restam dúvidas, esta Tasca está a evoluir para caminhos bem interessantes e que me parecem ser a verdadeira praia e desejo do chef, o sushi começa a ocupar um lugar mais pequeno na carta, com os comensais a deixarem-se levar por outros sabores, mostrando que o Japão não é apenas técnica, peixe e shari.

Haja muitos jantares como este e sucesso e clientes nunca faltarão!

Shiko – Tasca Japonesa
22 323 9671
Rua Sol, 238 – Porto

 English Version

 Fotos: Flavors & Senses 

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