Localizado num histórico edifício do séc. XVII, no coração do Quartir Latin, entre o Pantheon e o encantador mercado da Rue Mouffetard, o La Truffière, aberto por Christian Sainsard, é um marco da zona em que está inserido, onde se esperam pequenos bistros, bares e espaços de fast food, numa zona maioritariamente frequentada por turistas e estudantes universitários, eis que surge um restaurante especializado mas enigmáticas trufas e com uma das melhores cartas de vinhos da cidade de Paris, com mais de 4500 referências.
Ao entrar, fomos recebidos por uma equipa jovem e meticulosamente aprumada e gentil, que nos acompanhou à mesa para um almoço que se viria a revelar único. O espaço é bem estruturado, e fiel à história do edifício, com duas salas, uma mais moderna no piso superior e outra mais aconchegante e romântica na cave. A cozinha do La Truffière , entregue ao chef Jean Christophe Rizet ostenta uma estrela michelin desde 2012, numa combinação do classicismo francês com técnicas modernas e sabores asiáticos.
Começamos a refeição, com um fresco amuse Bouche, uma mousse de aipo com notas citricas e uma textura fantástica. A acompanhar um excelente pão, fatiado no momento.
Gambas crocantes, emulsão de iogurte, concentrado de ervas
Um delicado e bem estruturado início de refeição, grande combinação de texturas, desde o sagu de tapioca ao crocante do camarão e a delicada e saborosa emulsão de iogurte. Interessante também o contraste com o pó de mostarda. Muito, muito bom.
A acompanhar um simpático vinho de Mikael Bouges, um pequeno produtor biológico do Loire, aqui bem representado pelo seu Prométhée Sec.
Vieiras, trufas
Um prato visualmente apelativo, que é uma preparação clássica de Rizet. Tudo aqui é sobre o contraste de sabores entre a terra e o mar. Vieira delicada, com cocção irrepreensível num prato cheio de sabor.
A harmonizar, um maravilhoso Chablis Premier Cru “La Forest” 2011, de Vincent Dauvissat, que além de funcionar muito bem com o prato deixou memórias. Um grande vinho.
Terrina de foie, ruibarbo, frutos vermelhos e chalotas
Não consigo resistir a uma boa terrina de foie gras, neste caso com a gordura a ser muito bem contrabalançada pela geleia de de ruibarbo e os frutos vermelhos. Leve sabor a trufa e uma textura macia, num prato mais uma vez muito bem conseguido.
Com foie, nada como um bom Sauternes, um Chateau de Myrat de 1996, que não sendo brilhante cumpriu bem as suas funções.
Robalo, Gnocchi de ervas e abóbora, cogumelos shimeji e clementinas da Córsega
Um prato simples, desta feita sem trufas, com o peixe muito bem cozinhado e bons gnocchis. Bom contraste com a acidez da clementina. Ainda que bom e bem preparado foi o prato menos interessante da refeição.
Foi servido um Clos des Quarts, Pouilly Fuissé de 2009, um chardonnay da Borgonha, bem estrutura e complexo.
Numa pequena pausa foi servido um cremoso e delicado sorbet de yuzu (citrino japonês), com a função de limpar o palato.
o Sub-chef a preparar o Sorbet de Yuzu
Rabo de boi, puré de batata, trufa preta
Para finalizar os pratos principais, era impossível terminar de uma forma mais segura. Um delicado e suculento estufado de rabo de boi, acompanhado de puré de batata trufado ( com trufas e não com os odiosos óleos e azeites) , molho de carne e finas lascas de trufa. Um prato que conjuga vários pecados mortais. Uma combinação clássica, mas sublime no que toca a sabor.
Para um prato de grande nível e potência, o vinho não poderia ficar para trás, sendo sugerido pelo escanção um Château Talbot 1970, um vinho da região de St. Julien, já com pouca fruta mas taninos ainda bem presentes e com uma estrutura e complexidade que funcionaram muito bem com o prato.
A selecção de queijos é vasta e pecaminosa, acabando por provar vários estilos e sabores, servidos à temperatura correcta.
Creme de manga e maracuja, emulsão de leite, merengue de chocolate
Uma pré sobremesa que facilmente poderia ser o doce principal. Bom contraste de sabor e textura entre os diversos elementos, com a emulsão de leite a surpreender como elo de ligação.
Merengue de coco, sabayon de limão, emulsão de toranja e sorbet de manjericão
Não fiquei convencido pelo merengue de limão, no entanto a frescura e leveza dos restantes elementos, revelou um bom final de refeição, sem excessos de açúcar e com uma acidez muito bem integrada.
Para os doces, foi servido um copo de Domaine D’en Segur Sauvignon d’Or 2011, um branco leve e doce com notas de fruta tropical, que não sendo particularmente interessante, resultou no seu propósito.
Destaque ainda para um delicioso macaron de trufa servido nos petit fours.
O La Truffière, é famoso e premiado pela sua cave de vinhos, como já disse, com mais de 4500 referências, pelo que aproveitamos para fazer uma pequena visita, pelo mundo dos seus vinhos, que vão dos mais importantes e raros Châteaux’s de Bordéus a vinhos de todo o mundo, com Portugal a destacar-se principalmente pela presença dos vinhos da Niepoort e Vallado além das grandes casas de vinho do Porto.
Além de restaurante, o espaço acaba por funcionar também como uma cave de vinhos, onde as pessoas podem entrar apenas para visitar, provar alguns vinhos e claro comprar algumas das suas referências.
O Serviço respeita todas as regras da alta restauração francesa, com todos os pormenores a serem meticulosamente tidos em conta. Podendo facilmente sair-se daqui com a sensação de ter o rei na barriga.
Considerações Finais
Da pequena mas bem estruturada cozinha de Jean Christophe Rizet saem pratos de autor, ricos em sabor com técnica aprimorada e conjugações raras. A trufa é claro, é a especialidade da casa, trabalhada da melhor forma possível durante as suas épocas fortes e com uma integração perfeita nos pratos que vai muito além das simples raspas sobre o prato. É um restaurante acolhedor e romântico que facilmente nos faz esquecer o mundo exterior. A carta de vinhos, ou a “bíblia” de vinhos, tal o seu peso e as preciosidades presentes, tem ofertas para todos os gostos e bolsas. Estando em Paris, tudo tem um preço, e uma refeição à carta ou os menus de degustação deste restaurante Michelin, vem com um preço que não está ao alcance de todas as carteiras, no entanto, a fórmula de almoço de 38€ (entrada+prato+sobremesa), sem trufas, claro, é certamente uma das melhores opções entre os estrelados da cidade.
La Truffière
4 rue Blainville – Paris
+33(0)1 4633 2982