Mont Bar

Será este o momento da democratização das estrelas Michelin? Podemos ir a um espaço estrelado e beber um copo de vinho e comer um prato ou alguns snacks? Poderá um bar receber uma estrela? Foi certamente isso que passou pela cabeça de Ivan Castro, o proprietário do Mont Bar, quando receberam o convite para a gala de 2023. E sim, um pequeno wine bar de esquina em Barcelona ganhou a sua 1ª estrela!

Mas voltemos mais atrás para perceber o fenómeno! Há cerca de 10 anos Ivan, depois de um percurso familiar ligado à hotelaria, decide abrir um pequeno bar, decorado com bom gosto, numa combinação de Bistrot elegante e wine bar, que servia tapas diferenciadas dos demais. O sucesso foi grande, a esquina da Carrer de la Diputació com Aribau tornou-se pequena e quis o destino que na porta ao lado, Ivan e a sua esposa abrissem o – ainda mais informal – Mediamanga. No entanto, e ao contrário de tantas histórias que todos conhecemos, a malograda pandemia trouxe ao Mont Bar a cereja no topo do bolo. Com o encerramento de todo o projecto el Barri de Albert Adrià, Fran Agudo – até então chef do Tickets juntou-se a Ivan e Kasaundra para reformular e inovar ainda mais o que se fazia por ali.

A ideia sempre foi a de criar um espaço informal, com uma cozinha séria, de produto e com muitas nuances de vanguarda, onde sobressaíssem os snacks e os pequenos pratos de partilha, e foi isso mesmo que nos levou até lá para um almoço ligeiro antes de um voo de regresso a casa.

Começamos com um Albariño escolhido entre as mais de 250 referências do espaço, e um amuse bouche à base de salsa e cogumelos que deixava antever que a cozinha de vanguarda seria o mote dos snacks que se seguiriam. Com isto rapidamente percebemos que também no serviço começaram logo por mostrar que não estávamos num qualquer bar de esquina catalão, considerando o rigor e o conhecimento que demonstravam e nos levava para outros ambientes.

Amuse bouche – Salsa e Cogumelos

Soufflé de Berbigão
A quase já clássica Air Baguette de Adrià recheada com espuma de hondashi, endro e berbigões de alta qualidade abertos no ponto. Um delicioso contraste de texturas e sabor a mar com nuances de frescura.

Um início ímpar ao que se seguiu um Tártaro de Wagyu com pão de chipotle, onde se destaca a textura e untuosidade da carne bem contrastante com a base arejada, crocante e levemente picante do chipotle.  Lula, Pele de frango 
Se até aqui o nível ia bom, aqui subiu a outro patamar – o molusco com uma textura sedosa e suave como se encontra apenas nos melhores espaços de sushi, em contraste com a pele crocante e bem seca levam-nos num jogo sabor e textura únicos. Um grande, grande snack!

Bikini de camarão e pézinhos de porco
No momento seguinte a cozinha de vanguarda dá as mãos à cozinha de conforto dos bares que aqui homenageiam. Porco e camarão – um casamento famoso na cozinha asiática, que aqui ganha forma como uma fina sanduíche de recheio gelatinoso e exterior crocante com os pequenos camarões a ficarem bem tostados. Para comer em dose dupla!

Ventresca de Atum, molho de pinhão
Entrando nos “pratos principais” a irresistível ventresca de atum marinada em teriyaki com molho de pinhões e notas levemente fumadas, a acompanhar fatias de bom pão. Produto de ótima qualidade, trabalhado com precisão e respeito, num prato que não apetece parar de comer.  Canelone de Frango, cantarelos e foie gras
O prato mais conservador é também ele o mais profundo em sabor, com notas de outono bem casadas e técnicas que são tudo menos simples. A começar logo pela massa fresca, o frango ainda húmido e suculento, o molho rico de foie gras e o ótimo demi-glace. De limpar a última mancha com a côdea do pão!

Twister de Lavanda
Finalizamos com um regresso à infância e aos gelados da Olá (ou neste caso da Frigo) numa versão de alta cozinha, levemente aromatizado com lavanda, boa textura e sabor delicado, perfeito para um final leve como se pretendia.

Houve ainda tempo para uns petit fours preparados com elegância e savoir faire

Nos vinhos optamos por seguir toda a refeição com Albariño de 2020 1583 de Fefiñanes de aromas expressivos com algumas notas especiadas e fruta de caroço, com a boca a revelar uma ótima frescura e uma estrutura capaz, fruto do seu curto estágio em madeira.

Como referi anteriormente, o serviço decorreu de forma irrepreensível, deixando antever que o sonho de democratizar a alta gastronomia há muito que fazia parte das intenções de Ivan. Certo que hoje, depois da estrela, os preços aumentaram ligeiramente e o menu de degustação surgiu quase por obrigação, mas continua a ser possível escolher à carta, e deixar-se levar por alguns snacks ou um, ou outro, prato bem hidratados com vinho a copo como na génese do restaurante.

Considerações Finais
Este pode muito bem ser o restaurante de fine dining para pessoas que odeiam fine dining. Do ambiente relaxado de bistrot à cozinha de produto, técnica mas irrepreensível. Aqui não encontramos a imposição de um chef ou a rigidez institucional da maioria dos restaurantes do segmento, é aquele restaurante elegante que poderia muito bem ser o bar de todos os dias, onde podemos divagar entre mesa, balcão ou o bulício da esplanada se estivermos nesse mood, a carteira é que, claro, irá sofrer as consequências de uma cozinha e um serviço de primeira linha.

Se voltaria? Já amanhã, e de preferência sem um avião para apanhar de forma a poder mergulhar a fundo em todo o seu menu.

Preços a partir de 60€ (sem vinhos)
Carrer de la Diputació, 220  – Barcelona

Fotos: Flavors & Senses
Textos: João Oliveira
No Comments Yet

Leave a Reply

Your email address will not be published.