Antiqvvm – “Cumplicidades Gastronómicas” Vitor Matos convida Eurico Castro

antiqvvm - 1O Jardim e a vista imperdível do Antiqvvm*

O Antiqvvm é uma das últimas adições à, cada vez mais apetecível, lista de restaurantes de fine dining na cidade do Porto. Depois de uma das mais comentadas movimentações da restauração em 2015, a saída de Vitor Matos do Largo do Paço em Amarante (*Michelin), a cidade do Porto, e mais propriamente o antigo Solar do Vinho do Porto, tornaram-se a nova casa de um dos mais criativos e artísticos chefs nacionais.

Aproveitando um convite para o jantar a quatro mãos com Eurico Castro (Restaurante Porta – Bragança), lá fomos conhecer este novo espaço, que promete mexer com a cidade.

antiqvvm - 2A bonita entrada do Restaurante*

Seguindo os encantadores caminhos do romântico, lá chegamos ao histórico edifício do Solar do Vinho do Porto, que partilha a vista e o espaço com os famosos jardins do Palácio de Cristal. Uma casa histórica, com jardins que nos seduzem e uma vista que nos deixa rendidos – por falar em vista, no Verão o jardim do Antiqvvm será certamente um dos espaços mais concorridos da cidade.  No interior manteve-se, e bem, a traça original, com respeito pelas arcadas e pilares seculares aos quais foram adicionados materiais nobres e requintados que nos transportam para um ambiente mais moderno e cosmopolita.

Sendo um evento privado, tudo decorreu de uma forma diferente do processo habitual de iniciar uma refeição, com  os primeiros vinhos e snacks a serem apresentados de forma volante. Por falar em vinhos, o jantar foi acompanhado pelos vinhos transmontanos da Mont’Alegre e da Quinta de Valle Passos, dois jovens produtores de uma região que merece cada vez mais atenção.

Os snacks passaram por clássicos de Vitor Matos, como o cone com ceviche e guacamole, o “macaron” com beterraba, mini pataniscas, tostas, bolas de Berlim 3.0 e uma batata brava fumada. Tudo muito bom e bem preparado! No copo estiveram também o Mont’Alegre Branco Clássico de 2015 que surpreendeu pela frescura e acidez, e o Valle de Passos Branco 2014, um vinho de elegantes notas florais e bom corpo que nos pede imediatamente comida.

Do Rio Baceiro à Mesa 
Truta, citrinos, mousse de escabeche, ovas e pão de girassol
Já na mesa, começamos a degustação com um prato de Eurico Gomes à base de Truta que facilmente me transporta para a minha querida região de Trás-Os-Montes e para os peixes do rio que tantas vezes pesquei durante a infância. Bom o sabor de todos os elementos, com destaque para a textura da truta, levemente fumada e a mousse de escabeche. Boa também a adição do crème fraîche que nos restrutura o palato para continuarmos a prova. O erro neste prato foram as proporções dos elementos, apresentando demasiada espuma para pouco peixe, o que fez com que alguns dos sabores se perdessem perante o escabeche.

A acompanhar, e bem, o Mont’Alegre branco 2015, cuja frescura e acidez foram um parceiro ideal para o escabeche.

Nota alta ainda para o pão de maçã e passas que foi servido durante o jantar.

Tributo ao Michel Von Der Kroft (**Michelin)
Queijo terrincho, salva, trompetas da morte
Uma homenagem de Vitor Matos ao seu amigo Holandês apaixonado por Portugal. Um prato de aparência simples, distante das criações mais arrojadas do chef, mas repleto de sabor. Raviolis tecnicamente irrepreensíveis, com o queijo a fundir-se otimamente com a delicada manteiga das Marinhas que envolvia a massa. Os cogumelos deram ainda mais dimensão ao conjunto, num prato de emoções fortes.

A harmonizar esteve o Valle de Passos branco 2014 de que falei há pouco, com a untuosidade do prato a mesclar-se perfeitamente com a estrutura do vinho. Muito Bom!

Mar e Terra
Polvo, ervilhas, enchidos transmontanos, batata baby
Com assinatura de Eurico Castro, este foi o prato menos conseguido da noite, muito por culpa da textura demasiado rija do polvo (e não, eu não gosto do polvo a desfazer). Faltou também alguma cremosidade ao conjunto, um papel que o creme/pasta de ervilhas não conseguiu ocupar em plenitude. Nota positiva para o molho de pimentos e o pó de enchidos cujos sabores se mesclaram bem com o polvo.

Da nossa tradição transmontana “A Lareira”
Bacalhau, mão de vitela maronesa, grão de bico e couve portuguesa
Depois da tempestade veio a bonança, com o melhor prato da noite, um clássico reconfortante reinventando por Vitor Matos. Aqui, o habitual bacalhau com grão ganha dimensão e sabor com a adição da delicada e gelatinosa mão de vitela e do seu límpido e saboroso caldo que envolve todo os elementos numa combinação arrojada. Muito, muito bom!

No copo entramos nos tintos, com um Mont’Alegre Clássico 2013, um vinho furtado e elegante que deu espaço ao bacalhau para brilhar, complementando-o com eficiência.

Sabores de Vinhais
Butelo de Vinhais e cogumelos selvagens
Sendo eu um apaixonado pelo Butelo, as casulas e os típicos pratos de pote transmontanos, não deixo de ver com bons olhos a reutilização destes produtos, numa tentativa de lhes dar uma imagem mais modernizada. Assim, Eurico Castro criou um bom Butelo, desossado e bem temperado, conjugado com um arroz caldoso de cogumelos silvestres que, sem surpreender, resultou num prato feliz e reconfortante.

Este prato teve a companhia do Valle de Passos tinto 2014, um vinho elegante e bem construído.

Barriga de Leitão Bísaro 2011
Pêra bêbeda, pickle de cebola, maçã, vinho tinto, beterraba, alho fermentado e legumes
Mais um prato de Vitor Matos com um ótimo leitão, de pele crocante e carne macia, ladeado por uma série de sabores e texturas que o elevaram, como o caso do molho e do alho fermentado. Saboroso e bem conseguido!

A harmonização ficou a cargo do Mont’Alegre Reserva tinto 2013 em garrafa magnum, um vinho de boa estrutura que promete evoluir bastante bem.

A Horta doce da minha Infância (nova versão)
Requeijão de ovelha, abóbora, pinhões, castanha, laranja e moscatel
É costume dizer-se que menos é mais, mas aqui todos os elementos funcionaram, a solo e em equipa, para formar uma ótima sobremesa. Onde os vários elementos vão adicionando texturas e sabores, dos mais fortes e doces aos mais frescos, com a laranja e o moscatel a darem uma frescura que equilibra o prato. Técnica e visualmente irrepreensível a mostrar que neste Antiqvvm as sobremesas não serão um parente pobre da restante carta.

Em jeito de celebração brindou-se com um Moscatel Dalva 2009 em garrafa Mathusalem, engarrafada especialmente para Vitor Matos e este jantar. Um vinho bonito, com uma cor surpreendente e uma boca elegante, que não estando ainda no seu auge, promete mais uma grande colheita de moscatel para a marca.

Petit fours

O serviço de sala não tendo quebrado o jantar, teve pequenos erros mostrando alguma inadaptação! Normal neste tipo de eventos que foge ao alinhamento normal de uma sala jovem ainda sem as rotinas totalmente esquematizadas.

Considerações Finais
Estes jantares a 4 mãos são sempre bons momentos para os chefs abrirem as portas da sua cozinha, descontraírem da rotina do seu serviço e criarem uma interação diferente com a sua equipa e os seus clientes. Neste caso, e em especial para mim, foi de muito bom grado que vi esta representação de Trás-Os-Montes no Porto, seja nos interessantes vinhos apresentados (que desconhecia) seja nos ingredientes muitas vezes utilizados, como o Butelo ou o Queijo Terrincho.

É certo que o menu teve duas linhas, e que a cozinha de Eurico Castro não está ainda ao nível da execução e da técnica de Vitor Matos, mas é certo também que as revoluções se fazem aos poucos, e levar o fine dining até Bragança não será certamente tarefa fácil.

Quanto a Vitor Matos, é bom ver a forma como abraçou um novo projecto começado do zero, ver que a sua veia artística e criativa anda mais eufórica do que nunca e acima de tudo ver que está feliz, algo que se refletiu nos pratos que provamos. A sua vinda para o Antiqvvm faz bem ao Porto e à gastronomia da cidade.

É sem dúvida um espaço a não perder, e no meu caso fica a vontade de voltar ao restaurante para conhecer o menu onde não faltarão alguns “devaneios e loucuras” que tanto aprecio em Vitor Matos!

Antiqvvm
R. de Entre-Quintas 22o – Porto
+351 22 600 0445
antiqvvm@gmail.com

 English Version

 Fotos: Flavors & Senses e de divulgação (assinaladas com *)

Nota
Estivemos no Antiqvvm a convite da organização do “Cumplicidades Gastronómicas”, sendo que isso em nada altera o nosso trabalho cuja opinião e o texto são da exclusiva responsabilidade do seu autor.

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